segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

A Janela

Camila estava lá. Debruçada na janela como ficava todas as tardes depois que terminava seus afazeres. Ficava lá. Olhando o movimento. Pessoas, muitas pessoas andando pra cá e pra lá sem destino, sem nenhum motivo. Observava também as pombas que vira e mexe presenteiam as cabeças das pessoas que passam lá embaixo. Talvez, essa era a sua única diversão.

A rua estava movimentada. Além de muita gente, tinha muito trânsito. Também, pudera, já era quase natal. Camila estava lá, se divertindo, quando viu um senhor parado sob sua janela olhando para cima. Ficou intrigada.

“Que diabos esse cara está olhando?” – pensou. Quando se deu conta, notou que tinha mais gente olhando. Umas 9 pessoas, no mínimo. Ficou assustada. “O que está acontecendo?” – pensou. E nisso, mais gente se reuniu para observá-la. Alguns apontavam e sussurravam alguma coisa para a pessoa do lado. E Camila se sentia cada vez pior.

Pensou em sair da janela e ficar quietinha no seu quarto e só voltar quando todo mundo já tivesse ido embora. Mas não queria se dar por vencida. Pelo menos, não tão rápido. Afinal, só estavam olhando, nada mais. Aos poucos, a multidão ia aumentando. Tinha até um garotinho que ficou assobiando para chamar a sua atenção. Tinha também uma senhora com a cabeça coberta por um lenço branco que rezava um terço. Aquilo já havia passado dos limites.
De repente, Camila ouviu um berro desesperado lá de baixo. Era sua mãe. Pedia pelo amor de
Deus para não fazer “isso”.

- Mas isso o quê? – gritou.

E com os olhos cheios de lágrimas a mãe grita de volta, como se não tivesse ouvido a indagação da filha:

- Por favor, não faça isso. Você é tão nova para morrer. O que será de mim sem você?

Agora, Camila começou a entender um pouco aquela bagunça toda. E esbravejou:

- Eu não quero me matar. Quem disse isso?

E a mãe mais aliviada, grita:

- Não?! Então por que você me fez passar tanto nervoso? O que eu te fiz?

- Não fez nada, mãe. – disse.

Nisso, o povo que estava na calçada ficou decepcionado e em um coro, como num estádio de futebol, começaram a gritar:

- Pula! Pula! Pula! Pula!

E sua mãe, desesperada, com medo que Camila obedeça os gritos, berra:

- Não faça isso, filha. Por favor!

- Não vou fazer, mãe! – responde.

E uma voz de mulher surge no meio da multidão gritando:

- Ah não! Ameaçou, agora tem que pular. Que negócio é esse?

Revoltada, a mãe de Camila retruca:

- Você está louca? Ela não vai pular de jeito nenhum.

Quando Camila ouviu isso, ficou brava com a mãe e berrou:

- Como a senhora diz o que eu faço ou deixo de fazer? Se eu quiser, eu pulo sim.

A mãe aflita, solta um grito agudo:

- Não! Por favor.

Camila diz, ainda esbravejando:

- Então peça desculpas, senão eu pulo.

Quando ouviu isso, a galera ficou mais animada. E gritaram apoiando Camila.

Sem pensar duas vezes, a mãe se desculpa:

- Desculpa, filha. Não foi a minha intenção.

- Hum. Não sei. Você e essa sua mania autoritária. Sempre acha que manda na minha vida. Sempre tenho que dizer amém para tudo o que você diz. Quer saber? Cansei disso. Nunca vou te perdoar.

- Ah é?! Então é assim? Pula que eu quero ver. Se você se acha tão corajosa assim, pula. Se está insatisfeita com a sua mãe, pula. Se quer dar uma de gostosa na frente de toda essa gente, pula. Vamos! – revida a mãe.

- Não pulo. – Camila respondeu.

De repente, a torcida mudou de lado. E começaram a gritar lá de baixo:

- Não pula não. Você tem que ganhar o respeito da sua mãe. Fica aí.

E Camila responde para a multidão:

- Concordo com vocês. Não vou pular.

E a mãe, agora, calma grita aliviada:

- Ai, obrigado, meu Deus! Que bom!

Camila pulou.